Quem será o “abestado”?

Há fenômenos estranhos que acontecem no processo eleitoral e político brasileiro. Não é de hoje que Tiriricas no pleno exercício de um  direito se candidatam sem possuir os pré-requisitos para tal e, o que mais preocupa, acabam se elegendo com números expressivos de votos, sucumbindo durante o mandato pelo despreparo. Preparo que pode ser determinado por uma certa base de conhecimento das leis vigentes, uma certa capacitada de articulação e argumentação e mais alguns atributos que se sugerem recomendados para um bom candidato ao parlamento,  o que também não garante que estes irão cumprir bem a função tanto moral como operacionalmente.

A pesquisa Datafolha mostra que Francisco Everardo Oliveira Silva, o palhaço Tiririca, obteria 3% dos votos em São Paulo, chegando a 900 mil, considerando-se a proporção de 30 milhões de eleitores do Estado. Sendo assim, Tiririca seria, se a eleição fosse hoje, o deputado Federal mais votado em todo o país, e elegeria alguns outros candidatos com pouca ou nenhuma expressão eleitoral na sua legenda ou coligação composta, além do PR, pelo PT e PCdoB. Estes candidatos é bem provável que se elegeriam as custas de Tiririca com menos de 500 votos cada um.  Tiririca é o retrato do Brasil, que elegeu Juruna e votou no ficcional Cacareco.

Vestido de palhaço, Tiririca, em tom de deboche, aparece em diferentes inserções no horário eleitoral de seu partido, o PR. Identificando-se como “o candidato abestado”, ele usa bordões e diz frases como as seguintes:

– “Vote no Tiririca, pior do que tá não fica!”

–  “Oi gente, estou aqui para pedir seu voto porque eu quero ser deputado federal, para ajudar os mais ‘necessitado’, inclusive a minha família. Portanto meu número é 2222. Se vocês não votarem, eu vou morreeer!”

“Oi, eu sou o Tiririca da televisão. Sou candidato a deputado federal. O que é que faz um deputado federal? Na realidade eu não sei, mas depois, eu te conto.”

– “Quando vocês apertarem na urna eleitoral, vai aparecer esse cara aqui, e esse cara aqui sou eu. Ô candidato lindo!”

– “Você está cansado de quem trambica? Vote no Tiririca”

Para deputado federal, Tiririca. Vote no abestado”

No horário eleitoral de ontem, Tiririca apareceu inicialmente escondendo o rosto e perguntando: “Adivinha quem está falando? duvido vocês ‘adivinhar’! “. Em seguida, tirou as mãos do rosto e declamou: “Sou eeeu, o Tiririiiica, candidato a deputado federaaaal, 2222, não esqueeeeeça, peguei vocês, enganei vocês, vocês ‘pensou’ que fosse outra pessooooa, sou eu, o abestaaaaado, vote 2222!”

Como a história mostra que os Tiriricas eleitos não tiveram o mesmo  sucesso no mandato, não nos atreveremos a dizer que criticar suas candidaturas é  discriminar os menos “favorecidos”. Votar em candidatos que no discurso já demonstram uma certa desestrutura, não só é um ato de pouca inteligência, como também de irresponsabilidade, apesar de uns justificarem como sendo um voto de protesto. Haverá outras formas mais eficientes de protesto, né? Resta saber, quem será mais “abestado”: o candidato ou o eleitor? Tomará que esta pergunta perca o sentido, na medida em que as urnas não comprovem a tendência da eleição do “abestado”.

Marcos Kayser

Será possível torcer pelo rival?

Há dois momentos especiais que levam um colorado ou um gremista assistir a uma partida de futebol: quando joga o seu time ou o seu rival. Pelo seu time torce, pelo seu rival seca. Para o torcedor mais radical, mencionar o nome do rival já é coisa arriscada, pois tal atitude pode comprometer sua fidelidade ao time do coração. No jogo do Grêmio e Corinthians pelo Brasileirão todo bom colorado só tinha um objetivo, torcer pelo Corinthians mesmo que o Corinthians seja um concorrente direto ao título e esteja na segunda posição do Brasileiro. Contudo, eu não consegui torcer pelo Corinthians. Também não consegui ficar neutro, até porque dificilmente assisto a um jogo de futebol sem torcer por algum dos times, nem que a partida seja entre Uberaba e Uberlândia. Torci para o Grêmio e até os que estavam comigo se assutaram. No início do jogo quando falei que torceria para o Grêmio estranharam, mas quando apresentei minhas justificativas e demonstrei que estava realmente torcendo para o Grêmio um chegou a dizer que sua torcida seria pelo empate. E por que torcer nesta partida para o principal rival? Para honrar minha paixão pelo colorado, ferida por ter sido violentada naquele 2005, quando nos roubaram o tetra campeonato, anulação de partidas, expulsão do Tinga e não marcação daquele pênalti que certamente seria convertido e nos daria a vitória em plena São Paulo. Com esta breve recaída, percebi mais uma vez que pelo bem do meu time, as vezes é possível torcer pelo rival, desde que este rival não cause ameaça. Já nos anos 90 quando o Grêmio de Felipão enfrentava o Palmeiras do Luxemburgo, a soberba do Luxa e a parcialidade da imprensa nacional, pendendo para os paulistas, agitava minha alma gaúcha e acabava me impedindo de torcer contra os gremistas. O futebol é capa de muitas coisas. Não é à toa que o filósofo Albert Camus reconhecia no futebol a fonte da sabedoria moral. “O que finalmente eu mais sei sobre a moral e as obrigações do homem devo ao futebol…”, dizia Camus.

Marcos Kayser