Escrever: árdua tarefa

Fico encabulado quando ouvintes e leitores comentam seu gosto por alguns escritos e comentários que faço. Procuro me empenhar para escrever o melhor, mas estou longe daqueles que detém o dom e são verdadeiros artistas no trabalho com as palavras. Quando tenho a sorte de estar iluminado, consigo produzir um artigo razoável,  o que até me aproxima de um cronista, mas esta inspiração é uma raridade.  Penso que escrever é uma árdua tarefa e, em se tratando de crônica, é preciso fundir uma visão lúcida da realizada com uma certa dose de provocação e ironia. Considero essencial provocar a reflexão e não se limitar a reproduzir os fatos com comentários vagos. Escrever assim é um convite ao filosofar e aí surge outra dificuldade: tudo parece já ter sido dito. Tenho a impressão que os filósofos gregos tiveram todos os insites necessários para construir a base do pensamento ocidental e relataram através de suas filosofias. Mesmo que muitos não reconhecem, até religiões como o cristianismo e o espiritismo “bebem água” na fonte grega. Assim sendo, sou um mero repetidor. O que ainda me estimula e, em parte, me justifica escrever, é a crença de que o cenário onde as idéias se encontram está em contínua mudança. Conceitos como o da verdade, por exemplo, podem ser repensados quando estamos diante de novos contextos, inclusive o da ciência que a cada dia revoluciona. Espaços virtuais como Facebook e Twitter  são contextos novos que sobre o quais os velhos conceitos ainda valem mas precisam ter suas formas de vida reavaliadas. Como pensar a ética da comunicação se na Grécia antiga a Internet não era se quer imaginada? Um outro estímulo para o trabalho que tenho de escrever, é sentir que alguns ouvintes e leitores encontram sentido no que escrevo. Este é o maior estímulo e com ele vem o compromisso com a escrita responsável, aquela que tenha coerência contextual e um mínimo de originalidade, por mais difícil que seja. Aproveito para pedir aos leitores e ouvintes que encontrem uma forma de me avisar quando eu estiver tratando de assuntos pouco interessantes ou ainda estiver fazendo mal uso das palavras. E acima de tudo agradeço o alto grau de tolerância para com este esforçado blogueiro e comentarista.

Marcos Kayser

O Mestre

Diz o Wikipedia, e agora não é mais o Aurélio, que mestre é um indivíduo que adquiriu um conhecimento especializado sobre uma determinada área do conhecimento. Com sua grande especialização no assunto, é capaz de dar aulas a pupilos. Habitualmente é usado como título acadêmico para aquele que defendeu um mestrado. O mesmo termo de mestre pode ser usado nas artes marcias.  Contrariando parte desta definição, há quem seja mestre sem ter mestrado. Há também quem seja mestre em múltiplas especialidades. E há ainda quem seja mestre sem necessitar da legitimidade de uma Academia. Eu e muita gente conhecemos  um mestre assim, com enormes habilidades intelectuais e marciais no enfrentamento das agruras da vida. Um mestre tão mestre que seu nome é mestre. Não só os ex-alunos lastimam a perda deste mestre, mas a humanidade que perdeu um mestre de ensinar a ser. Pensemos em grandes virtudes: humildade, generosidade, prudência, coragem, … Imaginemos um ser humano, reunindo tudo isso. A síntese de uma dialética entre rigidez e flexibilidade. Este é o mestre Bauer. E digo no presente porque jamais deixará de ser. Seus ensinamentos estão contindos na alma de muitos e continuarão sendo ensinados, por isso, não serão passado. E quem não tem histórias pra contar do mestre? Eu não só tenho histórias como eu tenho uma história com ele (dona Helena, Marco, Silvia e Fernando sabem disso). Na festa de aniversário da minha mãe, para quem ele era o amigo Harald, fiz uma declaração de amor na presença de todos. Falei a ele, como tantos já fizeram, que ele o meu maior pai. Apesar de se esquivar da exposição, mas ali ele “estava em casa”, me deu um forte e prolongado abraço e no pé do ouvido me contou: “tu sabe que eu sinto o mesmo por ti, né?” O mestre é daquelas pessoas que não deveriam morrer. Ele justifica minha indignação existencial para com a morte. Deveria ser imortal de corpo e alma. Os que creem já projetam ele  dando aulas no céu. Acho que a terra precisa muito mais dele do que o céu. Sim, mestre Bauer se eterniza nos seus ensinamentos e na sua obra, mas como humano, reconhecidamente egoísta que sou, vou sentir a falta da conversa, dos segredos, do tradicional aperto de mão, do sorriso quando ganhava uma sucata eletrônica. E talvez o mais incrível: o mestre era humano como nós! Nunca vi tanto irmão chorar ao mesmo tempo! Mestre Bauer, muito obrigado!!!
Marcos Kayser
08/05/2012

O encontro meu comigo mesmo

Imaginemos um momento raro, estamos sós e sem o que fazer.  O que sentiremos diante de nós mesmos? Tédio, prazer, medo, desejo? Por mais estranho que pareça, é na ausência do outro que pode haver um grande encontro.  O encontro meu comigo mesmo. Solipsismo, narcisismo, egocentrismo? Pode ser, pode não ser, mas, independente do que for, é um estado em que nossa estima e tolerância podem ser testadas. Sem falar na criatividade. Num mundo agitado, com um cardápio variado de opções de lazer, reais e virtuais, reservar um tempo para estar só é tido como um sintoma patológico.  Rilke diz que “a grande solidão é ir dentro de si e não encontrar ninguém durante horas, é aí que é preciso chegar.” Talvez para Rilke a solidão é um nada que dura horas que deveríamos suportar para depois destas horas haver o encontro do eu consigo mesmo. E se nada encontrar? Bem, neste caso, ainda há uma saída: fugir de dentro de si e ir ao encontro de um grande amigo.  Se não conseguimos nos encontrar com nós mesmos, um amigo poderá nos reconciliar. Diante de tantos afazeres que temos, com o foco ao que está do lado de fora, alguns encontram dificuldade para a introspecção e colocam na falta de tempo o motivo da impossibilidade da incursão valiosa pelas profundezas do nosso interior. Numa primeira impressão, ficar sozinho remete a melancolia, tristeza e até depressão. A ordem dos dias atuais determina que estejamos envolvidos com inúmeros compromissos, tarefas e festas. Os momentos de convivência com quem compartilhamos afeto são muito prazerosos e indispensáveis, mas não dispensa ficar também sozinho. Quando sós, somos mais verdadeiros e corremos menos risco de perder a própria identidade. E se isso acontecer, perde eu e perde a humanidade que estará com um a menos na sua pluralidade.

Marcos Kayser