É incrível como há um dia na semana em que o humor das pessoas muda substancialmente. Em alguns viventes a mudança chega ser da água pro vinho. No trabalho podemos pedir o que quer que seja àquele colega mais resistente e mau humorado que sua receptividade será bem diferente e, provavelmente, responderá positivamente ao que a ele foi solicitado. Este dia é sexta-feira e todos sabem os motivos da veneração. Sexta-feira é véspera do final de semana o que significa trocar o compromisso do trabalho pelo compromisso com o lazer e convivência da família. O compromisso não é o problema, o problema é o seu objeto. Nos dias da semana (segunda à sexta) o compromisso, em larga medida, é com os deveres do trabalho e nos dois dias do fim de semana (sábado e domingo) o compromisso é satisfazer nossos desejos. O dever está para a dor, assim como o desejo está para o prazer, e é natural (ou cultural) dos seres humanos privilegiarem o prazer em detrimento da dor. O que poderíamos fazer, então, para mais dias da semana se parecerem com a sexta-feira, afinal, dois dias de sonhos para cinco de pesadelos não seria injusto? Não só é injusto como é uma violência para com a nossa natureza humana, já que somos seres que tendemos mais ao prazer do que a dor, apesar que nem toda o dever é doloroso. A receita é simples de ser dada, mas nem tão simples de ser aplicada: é fazer do trabalho um compromisso desejado. E falo do trabalho porque ele ocupa a grande carga horária dos nossos dias úteis. É engraçado, dia em que a maioria trabalha é chamado de útil, o que faz pensar que é o trabalho que determina se os dias são ou não úteis e até se levamos uma vida útil ou inútil. Quem trabalha é útil quem não trabalha é inútil. Sem entrar no mérito da utilidade, o que importa é desfazer um pouco esta grande disparidade entre o final de semana e os dias ditos úteis. Que a vibração de sexta seja um sinal de que faltando prazer no trabalho.
Marcos Kayser
Filósofo
Arquivo mensais:julho 2012
A militância interesseira
Aquele que empunha a bandeira de seu candidato a um cargo público estará fazendo por ideologia ou meramente interesse privado e profissional? “Meus heróis morreram de overdose, meus inimigos estão no poder. Ideologia! Eu quero uma pra viver. Ideologia! Pra viver…”, diz a letra de Cazuza, lá nos anos 80, quando já se deparava pela falta dela e, ao mesmo tempo, via na ideologia um motivo pra viver. Um conjunto de idéias que vem antes de qualquer coisa para mostrar a verdade que se quer chegar. Uma verdade para todos com a pretensão de ser o mais universal possível, portanto, longe de ser particular. Isso se chama de ideologia. Na política, antes do interesse particular, vem o interesse público. Antes do meu interesse, do interesse de obter benefícios pessoais, ganhar ou manter o trabalho, por exemplo, vem o interesse da sociedade, da cidade, do Estado, do país. Acima do candidato deveria vir o partido com sua respectiva ideologia que representa suas idéias. Entretanto, não é o que ocorre, comprovando que os partidos políticos, nos quais os candidatos estão vinculados, na sua essência não possuem ideologia. “O amor é a única lei” é uma idéia cristã, contra a idéia pagã da “lei do olho por olho e dente por dente”. Saberemos distinguir a ideologia do PMDB para o PP? E trago estes dois que no passado eram MDB e ARENA para lembrar aos mais antigos que lá atrás existia uma diferenciação entre suas idéias, portanto, existiam idéias que lhes eram próprias. Hoje não há mais idéias que podem diferenciar este daquele e na uniformização das idéias não há diferença. Então, ter este ou aquele no poder, não muda nada, ao menos em termos substanciais e estruturais. Em termos nacionais, por exemplo, dificilmente haverá um presidente que feche o Senado Federal por inutilidade, mesmo tendo a vontade popular ao seu lado. Os interesses sufocam as idéias. O mesmo permanece, independentemente do partido que assumir o poder. Para nós povo eleitor, na ausência da ideologia o que pode fazer a diferença é a pessoa do candidato e, por isso, votamos nele e não no partido que ele representa. Assim, por mais cruel que seja, nos resta dizer que aquele que empunha a bandeira em causa própria, e assume uma militância interesseira, não tem outro motivo a fazer. Enquanto os partidos não tiverem suas próprias idéias e a partir delas definirem seus planos de governo, empunhar a bandeira do candidato continuará representando um ato muito mais profissional.
Terceiro ano do ensino médio, para quê?
Nos Estados Unidos, ao invés de cada universidade promover um vestibular, elas geralmente solicitam o resultado de dois testes: o Scholastic Aptitude Test (SAT) e o American College Testing (ACT). O SAT é um exame mais analítico, interpretação de texto, gramática, redação e matemática. Já o ACT é mais voltado para checar o aprendizado ao longo dos anos de escola. As questões avaliam o conhecimento do aluno em inglês, matemática, ciências, interpretação de texto e redação. Há universidades que, além dos resultados do SAT e do ACT, avaliam o histórico dos candidatos. Como dizem: “procuram avaliar o todo do aluno”. Avaliam se o estudante trabalha ou não, se precisou, por exemplo, cuidar de irmãos mais novos, se seus pais cursaram faculdade. No formulário de inscrição para a graduação, há perguntas que indagam sobre a vida do candidato fora da escola. Os avaliadores querem saber quais são os hobbies do candidato, suas atividades extracurriculares, se já trabalhou como voluntário em algum lugar. Aqui no Brasil, apesar de algumas novidades, como o Enem, mantemos o velho modelo em sua essência, prova que engloba todas as disciplinas, sendo que para ser aprovado na universidade público é necessário fazer um cursinho particular. É incompreensível que o Brasil, campeão de clonar modelos americanos, feche os olhos para o processo de ingresso à Universidade que é feito nos EUA e em outros países. Um fato que ilustra a ineficácia do modelo brasileiro é a aprovação no vestibular de adolescentes de 15 anos, que ainda estão na metade do segundo ano do ensino médio. Considerando que boa parte dos estudantes estão na escola em virtude do vestibular e a própria escola diz preparar para o vestibular, estes jovens que são aprovados antes de concluírem o ensino médio, na prática não necessitariam mais cursar o terceiro ano. Isso acontece não porque o ensino médio está adiantado mas sim porque a grande maioria dos estudantes estão num mesmo nível e pouca diferença há entre os que já concluíram e aqueles que não concluíram o ensino médio. Ou seja, é mais um fato que indica que há algo errado com a educação brasileira. Justamente ela, o maior motor para o desenvolvimento de um país. Chego a ter pena desta gurizada! Qual é o sentido que elas encontram para ir à escola? E depois combram dela mais engajamento e vontade. É justo? Estão esperando por quem? Pelo governo? Acredito que o problema da educação precisa ser resolvido pelos educadores e pela sociedade. Será falta de coragem e vontade, ou faltará criatividade? Talvez, diante do cenário, abolir o terceiro ano do ensino médio seria uma ato de coerência, por mais estranho e absurdo que pareça.