“Nada no mundo vale que nos afastemos daquilo que amamos. E, contudo, também eu me afasto, sem que possa saber porquê”. Esta frase de Camus serve para pensar as relações amorosas, seja na esfera privada, seja na pública. Tempo de liquidez, como Baumann diz, onde até o amor virou água. Pobre dos apegados, dentre os quais me incluo, que ainda buscam justificativas para ficar vivendo neste país. País injusto, que não reconhece o amor que sinto por ele, me rejeita e me faz sentir um estrangeiro. De pouco tempo para cá, tenho pensado em fazer as malas (“Eu me sinto um estrangeiro. Passageiro de algum trem. Que não passa por aqui. Que não passa de ilusão…”). Chego a me desconhecer. Imagino os que me conhecem. Por muitas vezes tentei convencer a ficar os desengajados (desapegados), que falavam não ver a hora de partir. Atualmente, não me arrisco convencer ninguém. Já me basta tentar convencer a a mim mesmo. Não sou eu que não quero, é o Brasil quem não me quer. Ele sabe que gosto de organização e o que encontro? Desorganização. Parece uma provocação. A ordem, no seu sentido mais amplo, produz coisas boas e traz beleza estética à vida. Eu gosto do belo e quem não gosta? Quem viaja para países considerados do primeiro mundo, destaca a organização como uma das primeiras virtudes a serem percebidas, junto da educação. Ambas andam juntas. A boa educação produz organização. Só não gosta de organização quem se aproveita da desordem. A política opera nesta lógica e alguns outros setores da economia também. Os desorganizados são presas fáceis. Os bancos vibram com aqueles que não conseguem organizar as suas finanças e precisam recorrer a empréstimos, pagando altas taxas de juros. O Brasil é sujo sob o viés estético. Vejam as ruas das cidades, as estradas, os prédios públicos, especialmente os mais antigos, e vai piorar porque os governos estão quebrados. As estruturas vão se deteriorando e carecem de manutenção. Não se planejaram para o longo prazo. O Brasil é sujo sob o viés ético. Vejam a corrupção. Toda a licitação tem seu preço e não baixa dos milhões. Mas um dia vai melhorar. Nós, sociedade, temos que nos organizar. Eu pensava assim há bem pouco tempo. Por dez anos me dediquei a um movimento que tentou planejar, envolver a comunidade, eleger prioridades e ajudar prefeitos a organizar suas cidades, em suas áreas mais fundamentais: educação, saúde, segurança, meio ambiente, desenvolvimento econômico. Morreu porque o brasileiro ainda está educado na cultura do “pão e circo”. Não aprendeu que para conquistar coisas melhores e alçar voos maiores é preciso um envolvimento muito superior. O prazer não se produz sem a dor. Todo o país que hoje nos atrai pela sua organização viveu uma revolução. Somos ainda crianças mimadas e mal educadas, enquanto cidadãos. Vivemos a ilusão de que dias melhores virão, afinal, Deus é brasileiro. Ironia do destino, acho que só aqueles que partiram ou pensam em partir podem salvar este país. Como? É tema de outra conversa. Cabe a uma minoria (des)iludida tomar a decisão. “Amar uma pessoa significa querer envelhecer com ela”. Camus de novo para ajudar os que já experimentaram o amor por alguém, para além do amor próprio, e vão ficando por aqui, mesmo tendo condições de partir.