Tivemos no último dia 20 a inauguração do novo prédio da biblioteca Amigos do Livro, biblioteca do bairro Empresa, biblioteca do Roberto Guedes, pintor apaixonado por livros e pela criançada. Parabéns ao Betão, à Salete e aos seus dois filhos, e a todos que, de alguma forma, ajudaram, principalmente a Ana, uma das grandes líderes que encabeçou a empreitada e continua com o Roberto nesta caminhada que não se encerra com a construção do prédio. Agora vem outros desafios árduos como angariar recursos que supram as despesas rotineiras. Apesar das novas instalações, do novo espaço, sabemos que pelo bem da comunidade do bairro Empresa o Roberto continuará sendo o mesmo, com o seu jeito de ser, com suas paixões e grandes idéias. A biblioteca também continuará a mesma, não perderá o clima acolhedor que possui, sempre aberta a todos, sem distinções. Tal qual a importância de incentivar a leitura e o gosto pelos livros, o conceito de biblioteca que o Roberto desenvolveu é muito mais complexo e profundo do que o conceito tradicional de biblioteca. O conceito de Biblioteca do Roberto abrange aconchego, atenção especial e despretenciosa à criançada. Entre gibis e clássicos encontramos respeito, afeto e diálogo. E por falar em clássicos, Platão e Nietzsche são alguns dos que encontramos por lá. Pelo gosto que tenho pela filosofia não vou deixar de reconhecer que fiquei enciumado com a coleção Os Pensadores que tive o prazer de encontrar nas prateleiras da Biblioteca. A transcendência do trabalho desenvolvido pelo Roberto pode ser percebida nas atividades que realiza como música, teatro e esportes. Se filosofia é criar conceitos, como diz o filósofo Delleuze, o Betão é um baita filósofo. Mais uma vez PARABÉNS e tomo a liberdade para lhe fazer um desafio: vamos espalhar bibliotecas Amigos do Livro pelos bairros de Taquara? Quem sabe lancemos um desafio: tornar Taquara a cidade do Rio Grande do Sul e até do Brasil com o maior número de bibliotecas comunitárias por habitantes? Já pensou daqui há algum tempo você inaugurar a quadragésima nona biblioteca Amigos do Livro? Para quem não sabe o significado destes quarenta e nove, pergunte ao Roberto, ele terá o maior prazer de contar uma história. Com tanta dedicação, com tantos ensinamentos, foi merecida a distinção já recebida por ser um dos cinco finalistas do Prêmio Fato Literário 2006, iniciativa do governo do Estado do RS, juntamente com o Banrisul e a RBS, que premia a instituição, personalidade, obra ou evento que, por sua qualidade e relevância, tenha se destacado e marcado o cenário da literatura no RS. Certamente a comunidade de Taquara e a região vão se unir para votar no Roberto já que um dos vencedores será escolhido através do voto popular. Contudo, independentemente do resultado, todos já reconhecemos que o Roberto é um vencedor, é vitorioso. Que o exemplo deste homem possa se estender pela cidade. Que o poder público faça muito mais do que fez, investindo continuamente em educação e cultura. Em infra-estrutura, em recursos humanos. Que o poder público não se limite apenas a reconhecer suas falhas e suas faltas para com a comunidade, mas que passe a investir maciçamente em educação, tirando recursos de uma administração austera, aplicada em cortar gastos supérfluos, em cobrar dívida ativa, em atuar com total transparência e outras ações cabíveis para retomar a capacidade de investimentos. Valeu Betão!
Arquivo da categoria: Artigos da aldeia global
Filosofia do Jogo de Futebol
Em época de copa do mundo, para quem gosta tanto de filosofia e futebol, nada melhor do que tentar pensar na possibilidade de fazer uma filosofia do jogo de futebol. Podemos pensar que a inclinação para o jogo já está presente nos animais que pela teoria da evolução nos antecederam. Jogar e brincar são atividades da natureza animal e humana. O jogo é parte da vida. Em ambos no uns ganham, outros perdem, uns nascem, outros morrem. Na vida o homem ao longo da sua história sempre buscou projetar-se nos ídolos, alinhar-se aos modelos tidos como símbolos e heróis, mais recentemente pessoas bem sucedidas. No futebol qual é o menino de hoje que não quer ser Ronaldinho Gaúcho? Na vida quem ama é fiel àquele que ama. É assim o amor de mãe, o amor de pai, e também o amor de amigo. No jogo de futebol impressiona a fidelidade que os torcedores possuem em relação ao seu time, podem até admitir trocar de carro, de emprego e de mulher, mas não admitem trocar de time, nem mesmo se ele passa por fases ruins. Observem: quantos gremistas trocaram de time ao caírem pela segunda vez para a segunda divisão? Provavelmente, nenhum. Assim como a vida, o futebol é uma arte. Treinadores criam estratégias e os artistas da bola criam jogadas brilhantes. O bom jogador não só incorpora a regra e a estratégia, mas a transcende. Ou seja, o máximo de vivência das regras implica na máxima criatividade. O “balãozinho”, a “bicicleta”, o “elástico”, as “pedaladas” são malabarismos que a liberdade possibilita sem infringir a regra. O jogo de futebol, para ser bem jogado, exige de quem jogue treinamento, dedicação e concentração. Não joga bem quem dá mais atenção ao público que à bola. O que vale mais para quem joga: o show ou a vitória? Se o Brasil jamais tivesse vencido um título mundial, e não tivesse potencial para vitórias, despertaria toda esta paixão? Na época da copa até os menos chegados param para assistir as partidas do Brasil. O futebol exerce fascínio sobre quem joga e quem é espectador. O jogo arranca o jogador e o espectador da sua temporalidade e instaura uma espécie de experiência de eternidade e de catarse, própria da experiência estética. Do ponto de vista fisiológico, jogar futebol faz bem para o corpo, é exercício, ajuda a eliminar toxinas. Do ponto de vista ético-moral, jogar futebol implica em cumprir com suas regras, incorporá-las, respeitá-las, caso contrário quem transgride recebe punição. Benefício ou malefício ambos o futebol pode trazer, dependendo da orientação que lhe damos. Pode se tornar alienação para aqueles que não vêem outra coisa, senão apenas a bola. Do ponto de vista social o futebol ajuda na socialização e para isso não precisa estar dentro do campo correndo atrás da bola, fazendo às vezes de jogador. Na condição de torcedor nos unimos aos outros torcedores seja para festejar, seja para criticar o treinador, o juiz ou o jogador. A vida, como e enquanto um jogo, tem suas regras que precisam ser conhecidas e respeitadas, sob pena de uma vida mais ou menos feliz, ou como queiram, um vida bela ou uma vida boa. Sabemos das dificuldades que encontrará a criança que não aprender as regras, os limites próprios do jogo da vida. O futebol também tem seus limites que se desobedecidos vira caos, desintegração e colapso. Imaginem se o jogo não tivesse tempo previamente determinado para acabar? Ou que cada time pudesse colocar o número de jogadores que desejasse? Simplesmente, não haveria jogo. Na verdade, mesmo que inconscientemente, estamos constantemente jogando, mesmo que no jogo da vida entramos no jogo em andamento, o que não nos tira o poder de interferência e realização. O jogo de futebol, assim como a vida, não é pré-determinado pelo destino. Um resultado positivo, como dizem os jogadores em suas entrevistas, é obtido ao longo da competição, graças ao talento de cada jogador, da sua individualidade, da estratégia do treinador, do entrosamento do time, sintonia fina entre dirigente, equipe técnica, jogador e torcedor. O sucesso depende tanto da individualidade, como do conjunto. Quem sabe toda a mobilização que o futebol provoca sirva de exemplo para as tantas outras mobilizações necessárias pela vida. Como se vê, no futebol também há espaço para a filosofia.
UM DIA DEPOIS DO OUTRO
Um dia nasci, estranhei tanto que chorei
Outro dia cresci, estranhei tanto que ri
Um dia quando criança pensei em ser logo um adulto
Outro dia quando adulto quis voltar a ser criança
Um dia me apaixonei
Outro dia amei de verdade
Um dia achei que não levaria jeito para ser pai
Outro dia troquei fraldas, dei tetéti e com meu filho brinquei
Um dia corri para chegar
Outro dia caminhei para me aproximar
Um dia achei que sabia tudo
Outro dia vi que eu era um mero aprendiz
Um dia arrisquei a saúde para ter muito dinheiro
Outro dia gastei muito dinheiro para ter saúde
Um dia vivi só pro futuro
Outro dia percebi que o futuro jamais pode ser vivido
Um dia pensei que ganharia todas
Outro dia perdi
Um dia achei que desilusões só aconteciam com o vizinho
Outro dia a desilusão batia a minha porta
Um dia achei que todos eram bons
Outro dia vi que a maldade é quase uma prioridade
Um dia pensei em resolver todos os problemas do mundo
Outro dia constatei que mal podia ajudar o meu mundo
Um dia acreditei inconscientemente que seria eterno
Outro dia vi que a vida pode ser eterna, mas, infelizmente sem mim
Um dia endeusei Deus
Outro dia Deus parecia não ser mais tão Deus assim
Um dia busquei explicações para o vacilo da minha crença
Outro dia encontrei as respostas em mim
Um dia vou morrer
Outro dia não haverá para me arrepender
Nada como um dia após o outro.
Entre a solidariedade e a generosidade
Hoje dia da solidariedade vamos falar um pouco sobre o significado deste conceito que não é uma virtude nem um sentimento como muitas vezes empregamos. Solidariedade é a coesão existente entre as partes de um corpo. Um exemplo bem objetivo, que não dá margem à múltiplas interpretações, por ser objetivo, é as peças de um motor que são solidárias na medida que só se movimentam juntas. Costumamos confundir solidariedade com generosidade. Dar mostras de solidariedade é agir a favor de alguém cujos interesses compartilhamos, ou seja, defendendo os interesses dele, também estamos defendendo os nossos interesses. Dar mostras de generosidade é agir em favor de alguém cujos interesses não compartilhamos. Fazemos um bem sem que isso reverta em algum bem a nós. Você serve sem que isso sirva a você. A generosidade em princípio é desinteressada. Nenhuma solidariedade o é. Ser generoso é renunciar, pelo menos em parte, a seus interesses. Ser solidário é defendê-los com outros. Ser generoso é libertar-se, momentaneamente, do egoísmo, que nos identifica como humanos. Ser solidário é ser egoísta junto com os outros. A generosidade é uma virtude moral. A solidariedade é uma necessidade econômica, social e política. A moral nos diz: como somos todos egoístas, tentemos sê-lo um pouco menos. A política nos diz: como somos todos egoístas, tentemos sê-los junto dos outros, convergindo interesses. A moral preconiza a generosidade enquanto a política justifica a solidariedade. O que vale mais? Moralmente, a generosidade. Mas ela não resolve a questão da exclusão ou da precariedade. Você por generosidade dá esmolas, faz doações, tira do seu para dar ao outro, mas aquele que foi ajudado continua na periferia, continua na excludência e a sociedade nem por isso deixou de ser menos injusta. Há necessidade da solidariedade entrar em cena. O interesse do excluído de entrar no jogo do mercado precisa ser meu interesse também. Aí não estarei mais dando esmolas por compaixão. Mas estarei pensando em conciliar interesses, planejando caminhos de mobilização, praticando ações que alimentem a natureza egoísta dos dois, minha e do outro, ou melhor, dos três, minha, do outro e dos outros. Uma coisa é ser egoísta a tal ponto de sufocar e massacrar o outro, outra coisa é ser egoísta e ser solidário ao egoísmo do outro. Que o egoísmo vire um direito de todos!
O silêncio diante da finitude
Diante das dores da carne e dos sofrimentos da alma, ambos corpo, que a contingência da vida nos traz, me diz o amigo Filósofo e Professor Castor Ruiz, que o silêncio solidário é a palavra mais significativa nos momentos difíceis. O silêncio da cruz é o sinal da impotência humana, perante aquilo que somos: contingência. Mas a dor que sofremos não deixa de ser uma revolta contra essa contingência, um grito que ao ser de angústia pré-anuncia a possibilidade da esperança. A nossa revolta contra a finitude que somos, ou seja, a morte, é também uma reviravolta sobre a possibilidade de transcendê-la. A natureza não cria (e não pode metafisicamente) nada além de si mesma. A natureza não poderia ter criado uma espécie natural que se revira e se revolta contra a finitude da própria natureza finita que a criou. A mera natureza não poderia ter criado a experiência sobre-natural de negação de si mesma, que o ser humano vive porque se percebe para além da própria contingência que o habita. Este ser para a vida está transpassada pelo Infinito, que damos um nome Deus, apesar de todas as distorções institucionais que sobre ele determinam. A transcendência é a condição de nossa existência humana em todas as dimensões do cotidiano. A esperança de Vida para além da morte é um clamor natural de nossa própria natureza, algo exclusivo de nossa condição humana. Agora, o privilégio da Esperança traz consigo a exclusividade de poder sentir dor/angústia, algo que nenhuma outra espécie sente. O silêncio da cruz fala muita mais do que podemos ouvir, a dor angustiante contém muita mais esperança do que podemos acreditar. A impotência perante a dor e a morte pré-anuncia um poder que nos transcende, mas que nos pertence. Perante a cruz da contingência só cabe a atitude de fé. A fé do cético que pensa que seus olhos vêm tudo que existe, é uma fé tão cega como a do cristão que se abandona à confiança de Vida plena; a fé do cético que faz de sua dor o sentido último da existência é uma fé tão arriscada como a do cristão que tenta fazer da esperança um sentimento de abandono no poder último da Vida (Deus). Perante os limites do sofrimento humano, da contingência, não podemos sair da experiência de fé. A razão não explica, a explicação é impotente e a impotência se torna a única razão de si mesma. Acreditar nas próprias razões do ceticismo não deixa de ser um ato de fé na própria argumentação. Quando se argumenta, faz-se do argumento uma crença, e não temos como sair de nossa condição de seres que acreditam sempre! Perante a contingência humana (dor, morte), não há provas, nem explicações, só silêncio. Silêncio que longe de vazio é recheado de esperança, que possibilita re-ligar, acreditar na transcendência, na tão desejada infinitude, pela qual o amor se eterniza. Amor de mãe, amor de pai, amor de filho, amor de amante, amor pela vida.
Marcos Kayser
A classe média tem ibope para governar o país
Já deve ser de conhecimento de todos a pesquisa realizada pelo IBOPE, no último mês de agosto, que ouviu cerca de 2.000 pessoas em 143 municípios do país, indicando que entre as instituições em que os brasileiros menos confiam estão em primeiro lugar os políticos com 90%. Apenas 8% confiam nos políticos, sendo que 2% não opinaram. Maior desconfiança registrada desde 1989, quando o Ibope começou a fazer este tipo de pesquisa. Os políticos se encontram no topo da desconfiança, enquanto que os médicos são os mais confiáveis com apenas 16% de desconfiança, sendo que 3% não opinaram, ou seja, 81% confiam. Em matéria de credibilidade os médicos estão acima inclusive da polícia e do poder judiciário, cuja desconfiança preponderou sobre a confiança. A polícia ficou com 35% de confiança e 61% de desconfiança, sendo que 4% não opinaram. O poder Judiciário ficou com 45% de confiança e 51% de desconfiança, sendo que 4% não opinaram. Os médicos ficaram acima até da Igreja Católica que teve 71% de confiança e 26% de desconfiança, sendo que 3% não opinaram. Diante da repulsa e indignação manifestada pela população contra os políticos e da alta credibilidade dos médicos, já ouvi uma provocação: não estaria a classe médica habilitada para liderar uma mobilização nacional em torno das reformas tão urgentes para começar tirar o país do caos em que se encontra? Quem votou nos médicos, provavelmente tem conceito semelhante se perguntado sobre os psicólogos, os fisioterapeutas, os enfermeiros. Então o leque de profissionais com crédito aumentaria ainda mais, e a abrangência destes é ampla. Estão em todo o país, organizados em sindicatos, em federações e cooperativas. Não vislumbramos os médicos caminhando, cantando e carregando bandeiras de protesto. Também não estamos lançando os médicos à candidatura pública. Estamos apenas supondo uma potencialidade, existente na classe médica, em liderar estratégias de mudança da conjuntura política de nosso país. Porque as punições traduzidas nas cassações que deverão ocorrer ainda estarão longe de resolver nossos problemas estruturais. É preciso mais. É preciso mudar a constituição. É preciso descentralização do poder. E como o país está doente, precisando de uma cirurgia, porque remédios não bastam, a classe médica poderia entrar em ação. Mesmo que o pós-operatório fosse doloroso, provavelmente valeria à pena, pois o resultado seria uma sociedade digna e menos violenta. Parabéns médicos e contamos com vocês!
Marcos Kayser
Manifesto contra a morte
Esta é uma tentativa de fazer poesia, mas está mais para um manifesto contra a morte. De poesia só tem algumas simplórias rimas. Não é a confissão de uma depressão. Mais do que uma questão de inteligência, de racionalidade, de LOGOS como diriam os gregos é a a declaração de uma paixão pela vida:
Falar de morte parece mania de velho, velhice que se desconfia estar longe de alcançar.
Mas talvez falar da morte seja uma forma da vida celebrar.
Nascemos sem ninguém perguntar a nós se desejávamos vir ao mundo.
Aí, nos expulsam do nosso mundo. De dentro da barriga da mãe.
No primeiro instante, recorremos à única possibilidade de contestação, o choro.
Berramos, berramos, mas ninguém tem compreensão.
Muito pelo contrário, os que nos observam são só animação.
Somos solapados por uma intensa indignação.
Depois de um tempo, percebemos que há mundos aconchegantes.
Do choro, caímos no riso da brincadeira com o pai, com a mãe, com os irmãos e com os amigos que às vezes são mais do que irmãos.
Sem nos preocuparmos com o amanhã, vivemos como se tudo acontecesse agora.
Nesta fase a vida é bela e ninguém quer viver sem ela.
Jamais pensamos que a morte a espera.
O tempo vai passando e intencionamos apressá-lo.
Queremos ser grandes para podermos fazer tudo que bem entendermos.
Aí vem o tempo da adolescência. Para uns aborrescência.
Achamos que podemos tudo, inclusive o tempo dominar.
Pouco sabemos do mundo e a morte nem pensar.
Aí vem o tempo da consciência. Para uns inconsciência.
Temos a ciência que o tempo é soberano, inclusive para terminar.
É a dimensão da finitude em contraposição com o desejo de continuar.
Tem algo de errado nesta vida. Antinomia como Kant já dizia?
Justamente agora quando aprendemos a amar.
Como o fim se apresenta não acredito que se sucederá.
Morreu e pronto! Acabou tudo!
Quem sabe o mistério poderá nos salvar?
Quem diria, chegamos aos quarenta, cinqüenta, sessenta,…
No tempo de criança reclamávamos que o tempo não passava.
Queríamos ser grandes e o tempo não corria só caminhava.
No tempo da adolescência nos achávamos os tais.
Queríamos dominar o mundo e o tempo podia esperar.
Agora aos quarenta o tempo continua sendo problema.
A maioridade chegou, vencemos mas o tempo continua nos insatisfazendo.
Agora não mais porque caminha, mas porque voa.
O que fazer então para controlar o tempo sem suprimi-lo pois se assim fosse estaríamos sucumbindo?
Se não podemos matá-lo de raiva, não dá pra enganá-lo?
Quem sabe vivê-lo intensamente?
Não só este instante presente.
Mas também engendrar as coisas boas do passado aqui e agora.
Vocês, nossos amigos são as coisas boas da nossa vida, amigos de hoje e de outrora.
É podemos citar Oscar Wilde que diz que a vida é apenas um tempinho horroroso cheio de momentos deliciosos.
Seria muito cinismo dizer que a vida é bela.
Mas como domar a fera do tempo é impossível, porque não encenar agora?
Convidamos a todos para comemorar este dia que representa mais um dia de vitória sobre a maldita.
Nem cegueira, nem escuridão
Paulo Santana, estimado colunista gaúcho, nos brindou com um excelente artigo publicado na Zero Hora do dia 29/05/2005, quando escreveu sobre a entrevista concedida pelo filósofo francês Michel Onfray à revista Veja. Nessa entrevista Onfray, que é ateu, critica duramente a idéia de Deus vendida pelas religiões. Segundo Onfray, por trás do discurso pacifista e amoroso, o cristianismo, o islamismo e o judaísmo pregam na verdade a destruição de tudo o que represente liberdade e prazer. Essas religiões, afirma o filósofo, exaltam a submissão, a castidade, a fé cega e conformista em nome de um paraíso fictício depois da morte. O encanto e a magia da religião desaparecem quando se vêem as engrenagens, a mecânica e as razões materiais por trás das crenças. As religiões, que dizem querer promover a paz, o amor ao próximo, a fraternidade, a amizade entre os povos e as nações, produzem na maior parte do tempo o contrário. Segundo Onfray, só o homem ateu pode ser livre, porque Deus é incompatível com a liberdade humana. Deus pressupõe a existência de uma providência divina, o que nega a possibilidade de escolher o próprio destino e inventar a própria existência. Se Deus existe, não somos livres; por outro lado, se Deus não existe, podemos nos libertar. A liberdade nunca é dada. Ela é construída no dia-a-dia. Onfray chega a citar exemplos de contradições encontradas nos livros sagrados. Nos Evangelhos, por exemplo, lê-se em Mateus (10:34) a seguinte frase de Jesus: “Não vim trazer a paz, e sim a espada”. O mesmo evangelista afirma a todo instante que Jesus traz a doçura, o perdão e a paz. Para Onfray é possível acreditar em Deus e viver sem religião, mas não há religião que viva sem Deus. Deus e a religião são invenções humanas, assim como a filosofia, a arte ou a metafísica, todas criações que tentam afastar a angústia da morte. Como alternativa na proposição de valores morais e éticos, Onfray indica a filosofia que possibilita a apreensão do que é o mundo, do que pode ser a moral, a justiça, a regra do jogo para uma existência feliz entre os homens, sem que seja preciso recorrer a Deus, ao divino, ao sagrado, ao céu, às religiões. É preciso passar da era teológica à era da filosofia de massa. Inclusive Onfray criou o que na Europa chamam de Universidade Popular, espaço onde pessoas, de todas as origens, sem distinção de classe, religião, sexo, idade, formação, poder aquisitivo ou nível intelectual, se reúnem sob a orientação de um filósofo para discutir os mais diversos conceitos e questões. Voltando ao Paulo Santana, este discorda de Onfray por considerar a religião mais eficaz do que a filosofia no sentido de promover a felicidade. É uma pena que Paulo Santana nada comenta sobre a atitude de algumas religiões ou seitas que se fundamentam apenas na mecânica da pena e da promessa e, de fato, provocam nas pessoas uma alienação e acomodação preocupante. Sem muito pretensão, desacordo do Santana quando ele afirma que a fé principia quando a razão termina. Acho que ambas se co-implicam. Não dá para separá-las ao modo cartesiano. Precisam andar juntas. Fé sem razão gera cegueira e razão sem fé gera escuridão.
O amor como tema da filosofia
Desde sempre o amor é objeto de inquietação de filósofos e, mais recentemente, de psicólogos, sociólogos e psicanalistas. Amor sobre o qual Platão escreveu na sua obra “O Banquete” em que Sócrates expõe a teoria que ficaria conhecida como “amor platônico”. Quando somos jovens e ignorantes em filosofia, tendemos a nos apaixonar por pessoas fisicamente atraentes. Com o passar do tempo a fixação quase maníaca por um corpo em particular diminui e passamos a amar a beleza interior. Somos capazes de aprender que a beleza da alma é muito mais valiosa do que a beleza física. Aristóteles nunca escreveu especificamente sobre o amor, mas sobre a amizade. Ele achava que uma boa amizade, na qual duas pessoas se unem no amor pela verdade, era o que podia haver de melhor entre os homens. Para Shopenhauer, filósofo do século XIX “o sentimento amoroso radica exclusivamente no impulso sexual”. O amor é apenas um nome inventado que damos a um impulso de reprodução da espécie. Conforme cita Schopenhauer “(O amante) imagina que se esforça e se sacrifica por seu próprio prazer, mas tudo que faz, na verdade, é guiado pela reprodução da espécie”. Em sua obra máxima, “O Mundo com Vontade e Representação”, Shopenhauer explica porque o amor é um tema eterno: “O amor” é o objetivo último de quase toda a preocupação humana; é por isso que ele influencia nos assuntos mais relevantes, interrompe as tarefas mais sérias e por vezes desorienta as cabeças mais geniais. Ele não hesita em interferir nas negociações dos homens de Estado e nas investigações dos sábios. Ele sabe como insinuar seus bilhetes de amor e seus anéis de cabelo nas pastas ministeriais e nos manuscritos filosóficos”. Jean–Paul Sartre, filósofo mais recente, dizia que o amor é um “ideal irrealizável”. Isso porque queremos algo impossível das pessoas que amamos: somos atraídos pela liberdade e independência que detectamos nelas. No entanto, ficamos tão apavorados que tentamos privá-las desses atributos quando estabelecemos uma relação amorosa. “O amante quer ser amado pela liberdade, mas exige que essa liberdade, como liberdade, não seja mais livre”. Muitos outros filósofos tentaram traduzir em palavras o sentimento amoroso, mas parece ter sido os poetas aqueles que melhor conseguiram expressá-lo, conforme os versos de Quintana: “O amor é quando a gente mora um no outro.”
Marcos Kayser
Uma conversa sobre Desus
A natureza humana é um tanto quanto paradoxal. Somos natureza e não somos. O ser humano é natureza enquanto apresenta disposições naturais, como o desejo e o medo, embora os conteúdos do desejo e do medo não sejam os mesmos entre um e outro indivíduo, e, ao mesmo tempo, o ser humano se rompe da natureza, na medida que se distancia dela pela sua dimensão criadora. Conforme Castor Ruiz: “O nascimento da pessoa se realiza a partir de uma ruptura com o mundo natural. Essa ruptura cria inevitavelmente uma fratura entre ela e o mundo. O ser humano foi expulso do paraíso natural. É desse modo que ele se distanciou do mundo ao qual anteriormente seu ser estava integrado de modo pleno. Essa distância relacional do mundo propiciou uma separação relativa entre a pessoa e a realidade que nunca mais poderá ser suturada de modo absoluto. Com esse distanciamento se consolidou uma ruptura entre o sujeito e o objeto. De agora em diante, o mundo sempre será vivenciado como algo contraditório: estando próximo, sempre aparece distante; embora somos um fragmento dele, o percebemos como o outro.” Entre outras coisas, Castor nos faz pensar sobre a possibilidade de uma solidão do homem, de um desamparado em que se encontra no universo infinito, que por ser infinito passa a ser também incerto, sem verdades absolutamente válidas. Em outras palavras, estamos falando que o animal é muito mais filho de sua mãe, a natureza, do que o ser humano que não é mais tão natural mas sim cultural. Poderíamos pensar que a religião preenche em certa medida a solidão do homem e funciona como uma espécie de consolo, quando Deus é colocado como a razão de todas as coisas. Não estamos sós se estamos com Deus. Todavia, admitir Deus não significa saber explicá-lo racionalmente ou prová-lo, pois cairemos certamente em contradição. Deus não deve ser resumido a uma mera explicação lógica como muitos tentam fazê-lo, uns ingenuamente outros presunçosamente. Exemplo: Afirmar que Deus existe porque a prova está aí e é a existência do universo, pode não ser uma afirmação 100% segura. E se o universo for infinito para frente e para trás? Poderá ter sempre existido e o que sempre existiu nunca foi criado, portanto, nestas condições não necessitaria de um criador. Segundo a ciência, que também não é detentora da verdade absoluta, antes do big-bang pode ter existido infinitos big-bang, com sucessivos big-cruch. Outra afirmação não tão garantida é afirmar que a Bíblia prova a existência de Deus. Como a Bíblia foi escrita por homens e não por Deus qual garantia de plena certeza. Como diz Kierkegaard: “Ser Cristão é sê-lo no espírito, é a inquietude mais elevada do espírito (…)”. Ou seja, a verdadeira fé é cheia de inquietações e de dúvidas o que também parece ser paradoxal. Não precisamos justificar Deus pela razão pois Deus é uma questão de fé, é pura intuição. Deus não se prova se sente. Tomemos cuidados com certos discursos ditos religiosos que promovem resignação, conformismo, alienação e até comércio. Transferem tudo que acontece com os homens, para a responsabilidade de Deus, como se fôssemos marionetes de um Deus manipulador. Como poderia um Deus que é Pai de todos querer o bem de uns e o sofrimento de outros? Numa relação de amor não há meio termo, ou amo ou não amo, não tem como amar mais ou amar menos. Independentemente da religião e da crença, temos uma vida de prazeres e muitas dores, cuja superação ou suportamento muito mais depende de nós do que da vontade Deus.
Marcos Kayser