Arquivo da categoria: Artigos da aldeia global

Do que uma simples lesão é capaz

Longe de masoquismo, uma lesão pode gerar satisfação. Jogando futebol com meus amigos, sofri uma lesão que me fez sentir dor e conforto ao mesmo tempo. Dor de um tornozelo com ligamentos rompidos, que me fazia nausear, se revezando com o sentimento de acolhida e apoio dos amigos. Incansáveis em disponibilidade de me acompanharem no atendimento médico e me levarem de cá pra lá e de lá pra cá. Depois, ainda se lembraram de telefonar para saber como me sentia. Isso tudo, levando em conta que no jogo de futebol, e talvez no jogo da vida seja igual, sou um chato. Não só porque jogo com garra, mas porque reclamo e falo a todo instante. Até que nos últimos tempos estas manifestações se atenuaram bastante, como eles próprios reconhecem, dizendo que agora não estou mais sozinho, outros parceiros assumiram a minha condição e já estão me ganhando na mania de reclamar. É bom ressaltar, em causa própria, que apesar de reclamar, jamais deixei de incentivar, com a mesma ou até maior intesidade. Só tenho a reconhecer e agradecer aos meus amigos do futebol, mesmo que eles com toda a humildade já tenham me dito: “deixa disso Marquinho”. Também aos amigos do cotidiano, agradeço pela incansável generosidade e solidariedade. E por falar em generosidade e solidariedade, me lembro do livro  “Pequeno Tratado das Grandes Virtudes”, de André Comte-Sponville, que expõe a sua visão filosófica destas duas virtudes. A generosidade, segundo ele, é estar disponível sem troca e oferecer ajuda sem contrapartida, extrapolando assim a solidariedade. Ser generoso é agir em prol do bem-estar de um indivíduo cujos interesses não compartilhamos. O generoso serve ao semelhante sem esperar que o semelhante sirva a ele. Ser solidário é obrar com boa vontade em favor de uma pessoa cujos interesses compartilhamos. O solidário ajuda esperando ser ajudado; ele defende os próprios interesses reivindicando os interesses dos outros. Segundo Comte-Sponville, a generosidade também excede o amor. Fazer o bem para quem quer bem é amor; agora fazer o bem sem ver a quem é generosidade. Tendo em vista que é impossível amar sem dar, a generosidade supera o amor porque é destinada ao estrangeiro. Na generosidade, o sujeito compartilha as suas riquezas com os estranhos porque sabe que é melhor dar aquilo que possui do que ser possuído por aquilo que tem. Saindo do conceitual e retornando ao real, ou seja, a experiência da lesão, seguida de dor e das dificuldades da recuperação, o que mais importa para mim neste episódio é que os conhecidos se colocaram como verdadeiros amigos, virtuosos pela solidariedade que tiveram comigo e pela generosidade que teriam caso eu fosse um estranho desconhecido. Digo isso porque entendo que a generosidade está a uma passo da solidariedade e, nesta hora, minha gratidão é a mesma, sejam generosos, sejam solidários. Em tempos de efemeridade, mais vale ainda o poder de uma amizade. Parece que a perenidade da amizade não se deixa seduzir pela efemeridade da nossa sociedade. E aí, de novo, agradeço a todos!

Marcos Kayser

Procura-se diversificação econômica

Um dos temas que preocupam o Vale do Paranhana é a falta de diversificação econômica na região. Historicamente, o Paranhana tem no setor do calçado sua principal fonte de desenvolvimento, geração de emprego e renda. Há cidades como Igrejinha, Parobé, Rolante e Três Coroas, que o percentual de empregos gerados no setor calçadista ultrapassa os 60% do total de empregos. Em Três Coroas este percentual é maior que 70%. Isso significa que estas cidades e, por consequência, a região tem uma economia nada diversificada, o que determina uma dependência quase exclusiva dos movimentos do setor calçadista. Não é difícil, nem precipitado, constatar que o risco para o desenvolvimento econômico e social do Paranhana é muito alto. Hoje a economia brasileira está estável, mas e quando surgir instabilidade, semelhante ao ocorrido em tempos passados? Ao mesmo tempo em que a indústria calçadista continua merendo cuidado e receber apoio, é a “menina dos olhos”, os munícipios precisam pensar em planos consistente de diversificação. Para isso, é fundamental envolver a sociedade civil organizada, entidades representativa do setor produtivo, como é assim nomeado, ou seja, entidades como a CICSVP. Não basta investir num distrito industrial, não basta as Instituições de ensino superior oferecerem cursos tradicionais como o de Psicologia e Enfermagem, sem desmerecê-los, é claro. Diante do cenário, o Paranhana precisa algo maior no sentido da inovação. Outras regiões estão muito à frente, inclusive com incubadoras instaladas. O empreendedorismo precisa ser fomentado e é indispensável integrar, discutir e planejar com visão de longo prazo. A Agenda Paranhana 2020 está aí para ser uma espécie de centro de confluência de idéias e planos. A Agenda não tem dono, é de todos, o que para muito pode parecer estranho, mas é uma proposta de mudança cultura que precisa ser compreendida e apreendida por todos, especialmente por lideranças que detém poder de decisão e governam. O desafio está lançado, a trilha traçada e as ferramentas disponíveis a quem dispor de vontade, que não seja muito apegado à vaidade.

Algumas do Millor

Segue algumas citações de Millor Fernandes, craque em expor a verdade numa só frase:

“Viver é desenhar sem borracha.

Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim.

Não devemos resistir às tentações: elas podem não voltar.

Esta é a verdade: a vida começa quando a gente compreende que ela não dura muito.

Certas coisas só são amargas se a gente as engole.

O dinheiro não dá felicidade. Mas paga tudo o que ela gasta.

Jamais diga uma mentira que não possa provar.

O cara só é sinceramente ateu quando está muito bem de saúde.

Quem mata o tempo não é assassino mas sim um suicida.

Pais e filhos não foram feitos para ser amigos. Foram feitos para ser pais e filhos.

Quando todo mundo quer saber é porque ninguém tem nada com isso.

Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus.

 [POEMEU EFEMÉRICO]
Viva o Brasil
Onde o ano inteiro
É primeiro de abril

Anatomia é uma coisa que os homens também têm, mas que, nas mulheres, fica muito melhor.

Aniversário é uma festa
Pra te lembrar
Do que resta.

Metade da vida é estragada pelos pais. A outra metade, pelos filhos.

O melhor movimento feminino ainda é o dos quadris.

Há duas coisas que ninguém perdoa: nossas vitórias e nossos fracassos.

Um homem começa a ficar velho quando já prefere andar só do que mal acompanhado.

O pior casamento é o que dá certo.

Quem mata o tempo não é um assassino: é um suicida.

Sim, irmão, o dinheiro não é tudo. Mas o que é que é tudo?

É melhor ser pessimista do que otimista. O pessimista fica feliz quando acerta e quando erra.

Qualquer idiota consegue ser jovem. É preciso muito talento pra envelhecer.”

O dinheiro não traz a felicidade. Manda buscar

O capitalismo é a exploração do homem pelo homem. O socialismo é o contrário

Eu sofro de mimfobia, eu tenho medo de mim mesmo e me enfrento todo dia.

Trabalho não mata. Mas vagabundagem nem cansa.

Nunca soube por que tanta gente teme o futuro.
Nunca vi o futuro matar ninguém,
Nunca vi o futuro roubar ninguém,
Nunca vi nada que tivesse acontecido no futuro.
Terrível é o passado ou, pior, o presente!

Todo homem nasce original e morre plágio.

Todo o casamento sem amor resulta em amor sem casamento.

O tempo não existe, só existe o passar do tempo.

Em ciência leia sempre os livros mais novos. Em literatura, os mais velhos.

O desespero eu aguento. O que me apavora é essa esperança.

Você pode desconfiar de uma admiração, mas não de um ódio. O ódio é sempre sincero.

Se você ainda mantém
A intenção moral-visual
De só encarar homens de bem
Segue este meu conselho:
Sai da rua,
Vai pra casa,
Tranca a porta
E quebra o espelho.”

Viver é se conhecer

 

Escrevi outro dia que viver é decidir. Agora acrescento que viver é conhecer. Decidir para nos tornarmos o que realmente somos e o que só poderá ser possível se nos conhecermos. Caso contrário, seremos qualquer coisa, exceto nós mesmos. Numa sociedade de consumo como a nossa, somos muitas vezes o que esta sociedade quer que sejamos. Permitimos conscientemente e inconscientemente a manipulação do nosso imaginário, produzindo desejos e sentimentos que não são nossos mas que acabam sendo assumidos como se fossem. “Gosto porque o outro tem e está na moda”. E assim perdemos nossa originalidade, isso se algum dia tivemos. Deixamos de ser nós mesmos e deixamos de viver criativamente nossa existência. Então, para que as decisões de nossas vidas sejam realmente nossas e nos tornemos o que verdadeiramente somos, recomenda-se conhecer a si mesmo, o que é bem óbvio, mas nem sempre assumido. Conhecer as virtudes, fraquezas, desejos e medos, requer coragem para imergir nas profundezas do nosso ser, um “sem fundo”, como nomeia o filósofo e amigo Castor Ruiz. Podemos nos frustrar e até nos assustar com algumas descobertas. Alguém poderá nos ajudar neste trabalho de autoconhecimeto, e há profissionais especializados, e há amigos, mas desvendar a intimidade compete apenas ao indivíduo que a retém. Descobrir-se é exclusividade da nossa individualidade. Sun Tzu na Arte da Guerra fala que não basta conhecer o inimigo para obter a vitória, é preciso conhecer a si mesmo, como condição para conhecer o inimigo. O mesmo Sócrates do “sei que nada sei” destaca a inscrição do oráculo de Delfos: “Conhece-te a ti mesmo”. Talvez jamais saberemos tudo sobre nós. Humildade para reconhecer nossa ignorância. Mas é preciso tentar se conhecer minimamente, sob risco de desperdiçar a própria vida. Momentos sozinhos, eu comigo mesmo, são indispensáveis. Os mais zen optam pela meditação, os mais racionais pela introspecção. Um ou outro, ou ambos, o que vale é o encontro. Num mundo cada vez mais cheio de trabalho e lazer, onde olhamos mais para fora do que para dentro e estar só se confunde com doença, há muita ignorância de nós mesmos, por mais que neguemos orgulhosamente. Sem olhar para si continuamente, em busca do novo e do velho, corremos o risco de fazer da nossa vida um autoengano. Novo e velho porque pela mudança constante de si e do mundo, sempre tem uma novidade para combinar com nossa antiguidade. Sem o autoconhecimento, abdicamos a própria vida e seremos velhos desconhecidos de nós mesmos.

 

Viver é decidir

A vida é um palco de decisões cotidianas. Na vida pessoal, na sociedade, no trabalho, é decisão pequena ou grande a todo instante. Enquanto somos apenas um projeto de existência, contido na idéia de nossos pais, nossa concepção depende exclusivamente de uma decisão deles. Depois de decidirem pela nossa entrada no mundo, até o nascimento vem um período ainda obscuro para dizer se decidimos ou não alguma coisa. Mas nos anos iniciais, podemos dizer que o nosso poder de decisão já aparece, apesar de mais primitivo e de menos elaborado.  O bebê chora quando tenta ser amamentado, decidiu rejeitar o leite da mãe. Quando crescemos um pouconossas decisões evoluem e se intensificam, pelo menos esta é nossa vontade, quando nos achamos adultos, mas ainda somos adolescentes. Já adultos, maduros ou não, nosso poder de decisão é uma exclusividade nossa, de mais ninguém, nem do acaso, nem do além. É de Sartre a famosa citação: “estamos condenados a ser livres”, ou seja, não temos como escapar das escolhas que fizemos na vida. A responsabilidade é nossa até mesmo quando silenciamos ou ficamos sobre o muro. Viver então é escolher constantemente e quando escolhemos exercitamos nossa liberdade. Daí que pode vir a culpa consciente ou inconsciente de ter escolhido o que não deveria ou, simplesmente, ter se omitido da escolha. Por depender essencialmente de nossos desejos e medos, a decisão é um ato individual e há dificuldades em compreender muitas decisões que os outros fazem. Afinal, se já não é fácil conhecermos a nós mesmos, quiçá conhecermos a pessoa alheia por mais próxima que seja. Todavia, para quem tem consciência de sua responsabilidade, o outro precisa ser respeitado. Como a vida é relacionamento, em toda decisão um ou mais estarão implicados. A decisão, apesar de ser um ato individual, tem um impacto na alteridade, por isso, sempre que possível, é bom decidir junto. No âmbito da política, as decisões podem ser tomadas com a participação popular, no âmbito da empresa, com a participação dos sócios e funcionários, no âmbito da intimidade, a família pode ser escutada. A decisão é um ato difícil de ser tomado, pois algo sempre será perdido, ou seja, aquilo que não foi escolhido e já será passado. Talvez, os mais egocêntricos e apegados tenham maior resistência e dificuldade. E uma coisa é bem provável: são asnossas decisões que determinam o que somos e seremos, doa o quanto doer. Também corre o risco de deixar de viver quem não tomar a decisão ou ficar esperando por outro decidir em seu lugar, o que não significa precipitação. Ouvi de uma criança e criança sempre filosófa com toda sua verdade: “se parar de pedalar, cai”. Se parar de decidir, a vida acaba!

Marcos Kayser

Brasil: o pior em serviços públicos

O Brasil é reconhecido como um dos países com maior taxa de impostos, mas apesar da alta carga tributária de 35,13% em relação ao PIB e a arrecadação de impostos ultrapassando a marca de R$1,5 trilhão em 2011, o país continua aplicando mal os recursos e prestando serviços públicos à população de péssima qualidade. É o que revela o “Estudo sobre Carga Tributária/PIB X IDH concluído pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário – IBPT, no último dia 16 de janeiro. Pelo segundo ano consecutivo, o Brasil aparece na última posição no Índice de Retorno de Bem Estar à Sociedade (IRBES) entre os 30 países que registram maior carga tributária em todo o mundo.

IRBES é o resultado da somatória da carga tributária segundo a tabela da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) de 2010 e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), conforme dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com a previsão do índice final para o ano de 2011. Quanto maior o valor do IRBES, melhor é o retorno da arrecadação dos tributos para a população.

A Austrália lidera o ranking, sendo o país que melhor retorna os recursos arrecadados para o bem estar da população, seguida pelos EUA, que caiu para a segunda posição em relação ao ano passado, e a Coreia do Sul. Já o Japão e Irlanda, que ocuparam, respectivamente, as 2 e 3ª posições na pesquisa anterior, caíram para 4º e 5º lugar no ranking de 2012. O Brasil fica atrás, inclusive, de países da América do Sul, como Uruguai, que está na 13ª posição e Argentina, na 16ª colocação. O que fazer para melhorar este quadro? Planejar melhor os investimentos, de curto, médio e longo prazo. Definir prioridades. Reduzir a corrupção. Ter políticos mais competentes e éticos.

Entre a autonomia e a liberdade

Fazer o que se quer, liberdade, quem não quer? Liberdade de querer, liberdade de agir, liberdade de pensar, são os três sentidos do conceito de liberdade. A liberdade de querer é a mais fácil de todas, basta ter vontade, o que não é tão fácil pois muitas vezes não temos vontade própria e outras vezes vivemos momentos de um nada de vontade. Liberdade de pensar é pensar por si próprio, apesar de muitos agirem sem pensar, portanto, são livres na ação, mas não são livres no pensamento. A liberdade de agir é talvez a mais complicada de ser conquistada. É agir sem a ausência de obstáculos como diz Hobbes. Mas na relação com o mundo somos impedidos pela lei, pelo governo, pelo colega, pelo parceiro (e que parceiro, hein?), enfim, por um outro que representa um obstáculo a nossa liberdade. Somos livres para querer, para agir, para pensar, enquanto a liberdade depende de nós, mas nem sempre é assim. Ninguém é livre absolutamente, nem totalmente. Também ninguém nasce livre. A liberdade precisa ser conquistada e junto dela a autonomia. Autonomia que se distancia um pouco da liberdade, que é mais geral, enquanto a autonomia é mais restrita. Pela autonomia tomamos decisões. A autonomia pode ser o motivo de permanecer num determinado trabalho, mesmo tendo a possibilidade de um outro com melhores perspectivas financeiras. Diz-se que a autonomia é a liberdade comandada pela razão. Por uma consciência do que eu quero e do que eu posso, levando em conta certos limites. É a liberdade valorada e controlada. Quem faz o mal age livremente, sob comando dos instintos, das paixões, dos interesses, dos medos, mas sem autonomia. A autonomia é obedecer ao mando da própria consciência, do auto-governo, sem desprender-se de uma ética. Autonomia seria então a liberdade para o nosso bem próprio e o bem do outro. Não nascemos autônomos, nos tornamos. Depende da nossa vontade e da nossa coragem.

Marcos Kayser



Estaremos nos idiotizando?

Quem navegou pelas redes sociais na semana passada acompanhou a repercussão do caso Luíza que ficou entre os 10 mais comentados do Twitter em todo o país, além de inúmeras montagens no Facebook. A origem está numa única frase de um comercial de televisão da Paraíba que diz: “Menos Luíza, que está no Canadá”. A propaganda em questão é sobre o lançamento de um prédio, estrelada pelo colunista social e pai de Luíza, Gerardo Rabello, que fala sobre o empreendimento e em determinado momento cita que o sucesso do prédio é tão grande que ele convocou toda a família para falar sobre o empreendimento, menos Luíza, de 17 anos, que está no Canadá, fazendo intercâmbio. Foi o que bastou para milhões de pessoas reproduzirem o meme das mais diversas formas até chegar nas televisões brasileiras. Meme é o nome dado a uma espécie de bordão que em pouco tempo se espalha pela Internet, rede mundial de computadores. A repercussão foi tanta que motivou o jornalista da SBT, Carlos Nascimento, chamar os brasileiros de “perfeitos idiotas”. O jornalista se referiu ao assunto Luíza e ao suposto caso de estupro no Big Brother. Segundo ele “não é possível que dois assuntos tão fúteis possam chamar a atenção de um país inteiro”. E seu comentário não deixa de ter sentido, afinal, se uma frase vazia como esta (menos Luíza que está no Canadá) é memorizada e capaz de mobilizar milhões de brasileiros em torno de sua disseminação, por que não temos a mesma memória e acolhida para assuntos que tem um impacto direto em nossas vidas? Por que não damos igual ou maior atenção às questões que envolvem, por exemplo, a corrupção no país, e a degradação do meio ambiente, a falência da saúde pública, a precariedade da educação, a demagogia e o desleixo dos políticos, enfim, problemas que afetam nossas vidas e comprometem nosso sonho de felicidade. É uma questão a ser pensada. Talvez os assuntos mais sérios, já se tornaram banais, ou exigem uma responsabilidade que não temos ou não desejamos assumir. Será que nossa sociedade está num processo de idiotização? Ou seja, estamos ficando mais idiotas?

Algumas citações de Rilke

Seguem algumas frases de Rainer Maria Rilke, um dos maiores poetas da língua alemã do século XX:

(…)Amar também é bom:porque o amor é difícil.
O amor de duas criaturas humanas talvez seja a tarefa mais difícil que nos foi imposta,a maior e última prova,a obra para a qual todas as outras são apenas uma preparação.
Por isso, pessoas jovens que ainda são estreantes em tudo,não sabem amar: tem que
aprendê-lo. Com todo o seu ser,com todas as suas forças concentradas em seu coração solitário,medroso e palpitante,devem aprender a amar.Mas a aprendizagem é sempre uma longa clausura.
Assim, para quem ama,o amor,por muito tempo e pela vida afora,é solidão,
isolamento cada vez mais intenso e profundo.O amor, antes de tudo,não é o que se chama entregar-se,confundir-se, unir-se a outra pessoa.Que sentido teria, com efeito,a união com algo não esclarecido,inacabado, dependente? O amor é uma ocasião sublime para o indivíduo amadurecer,tornar-se algo em si mesmo,tornar-se um mundo para si,por causa de um outro ser;é uma grande e ilimitada exigência que se lhe faz,uma escolha e um chamado para longe.
(…)Creio que aquele amor persiste tão forte e poderoso
em sua memória justamente por ter sido sua primeira solidão
profunda e o primeiro trabalho interior com que moldou a sua vida.(…)

Quero lhe implorar
Para que seja paciente
Com tudo o que não está resolvido em seu coração e tente amar.
As perguntas como quartos trancados e como livros escritos em língua estrangeira.
Não procure respostas que não podem ser dadas porque não seria capaz de vivê-las. E a questão é viver tudo. Viva as perguntas agora.
Talvez assim, gradualmente, você sem perceber, viverá a resposta num dia distante.

Amor são duas solidões protegendo-se uma à outra.

Não é somente a inércia culpada pela repetição dos relacionamentos humanos, caso a caso, indescritivelmente, de forma monótona e sem renovação. É a timidez diante de novas e imprevisíveis experiências para as quais acreditamos não estar preparados. Mas somente alguém que está preparado para TUDO, que não exclui NADA, nem o mais enigmático, vivenciará a relação com o outro como algo vivo.

Nada a poderia perturbar mais do que olhar para fora e aguardar de fora respostas a perguntas a que talvez somente seu sentimento mais íntimo possa responder na hora mais silenciosa.

Não procure pelas respostas que não podem ser dadas, pois você não seria capaz de vivê-las

A felicidade dentro da Felicidade

Felicidade Camargo Machado é o nome de uma senhora de 106 anos que Fabrício Carpinejar encontrou em suas andanças pelo Rio Grande. Reside sozinha, paga suas contas com o dinheiro da viuvez e não depende de mais ninguém, a não ser dela. Felicidade mora dentro de uma casa de madeira que fica dentro de uma casa de alvenaria e vive o que recita: “assim que somos: a infância dentro do adulto.” Felicidade sobreviveu ao inferno. Dos 15 irmãos é a única sobrevivente e perdeu o marido que foi assassinado por um homem traído. Apesar de não saber ler nem escrever, sem nunca ter lido um livro de poemas, Felicidade é poeta, de uma sabedoria aforística, como o próprio poeta Carpinejar a identifica. Diz ela:

“- Poema é cachorro lambendo meu joelho esfolado.

– O tanque de pedra é meu conselheiro.

– Já tive tempo de aprender tudo, desaprender tudo e agora estou aprendendo de novo.

– Perdi o jeito de rir de tanto sofrimento. Vou rir por engano.

– Quando acaba o fim, posso inventar novo fim com as paredes de sabão de vidro.

– A limpidez vem do movimento da água.

– Estou feliz para ser feliz um dia.”

Felicidade é uma escola de vida e longevidade em que a felicidade, por mais improvável que seja, é por ela dia a dia reinventada, sem perder ternura e simplicidade.