É humano desejar mais e mais, num movimento contínuo, de um desejo a outro sem cessar. Quem condenará aquele que deseja viver mais e mais? Esse desejo, que todos tem, Spinoza e Hobbes, chamavam de conatus. O desejo é a essência do homem, diz Spinoza. Ricos e pobres, mais e menos poderosos, todos desejam ao seu modo. O que muda são os objetos desejados. E nem todos os objetos são palpáveis e mensuráveis. Uns desejam um carrinho novo, outros carinho de novo. Basta estar vivo para desejar e só deseja quem está vivo. Não há vivente que não deseje. Até os entediados e deprimidos desejam. Desejam o nada, desejam a morte. A certa altura do “campeonato da existência”, uns realizam uma espécie de balanço para ver quais desejos foram satisfeitos, quais foram frustrados e quais ainda não foram realizados. Uns até vivem sem fazer esta anamnésia como diziam os gregos, talvez por receio de olhar para trás e encontrar mais culpas e decepções, do que desejos bem satisfeitos. Há os que temem constatar que a vida passou muito rápido e o passado pouco tem a significar. Refletir sobre a própria existência não é tarefa fácil. Minha natureza inquieta provoca desejos, não necessariamente inéditos. Muitos são desejos que já desejei e realizei. Desejo de criar projetos na empresa, desejo de estar junto dos filhos, desejo de atuar em movimentos sociais, desejo de me relacionar com pessoas que me atraem. Na verdade, tudo isso já tem um passado. Fiz e faço, mas por que descontinuar? Dirão que sou rotineiro. Direi que sou um rotineiro inovador, reinventando a rotina e desfrutando do seu prazer, dia a dia. Olhar pra trás ajuda a não ignorar o que de bom se conseguiu construir e, ao mesmo tempo, descartar aquilo que não cabe mais. No lugar do que foi descartado, abro o espaço ao novo que até então não tinha passado. Assim, velho e novo andam de mãos dadas, sem brigar.
Marcos Kayser